A “Pesquisa de Informações Básicas Municipais: Perfil dos Municípios Brasileiros 2009 (MUNIC 2009)”, divulgada semana passada, mostra o quanto ainda há para se avançar com relação à maior participação das mulheres nas instâncias de poder e decisão, assim como na efetivação de políticas públicas para reduzir as desigualdades de gênero.
O levantamento cita um dado já conhecido, de que apenas 9,2% das prefeituras dos 5.565 municípios brasileiros são administradas por mulheres.
Em relação a 2005, quando este percentual era de 8,1%, o quadro evoluiu pouco, e o aumento ocorreu principalmente no Nordeste, que concentra o maior percentual de prefeitas (51,2% do total).
Pela primeira vez, a MUNIC 2009 levou a campo um bloco específico sobre a gestão da política de gênero nos municípios brasileiros. O objetivo é conhecer a realidade dos municípios nesta área, aprimorar e monitorar a política implementada pelo governo federal, visto que as experiências de organismos executivos ou de serviços governamentais de atendimento às mulheres além de insuficientes são bastante recentes e pouco ou nada documentadas.
Segundo o documento, “o caráter transversal da temática de gênero supõe não apenas a incorporação de ações voltadas para a promoção da igualdade entre homens e mulheres nas agendas dos ministérios e secretarias do poder público federal, mas exige, simultaneamente, a ampliação da rede de parcerias estabelecidas nos âmbitos estadual e municipal, instâncias de onde partem as demandas sociais e para onde efetivamente são direcionadas as políticas em prol das mulheres. Neste sentido, a existência de estruturas responsáveis pelo tratamento das questões de gênero nos governos municipais constitui-se em um valioso instrumento para o processo de negociação e articulação de políticas na esfera governamental”.
Entretanto, os dados da MUNIC mostram que em 2009 apenas 1.043 municípios tinham algum tipo de estrutura direcionada para a temática de gênero, 18,7%. Em pouco mais de 70% destes municípios, a institucionalidade alcançada pela questão se deu no nível de um setor de políticas para mulheres e/ou gênero subordinado a alguma secretaria específica, sendo ainda muito pequena a existência de secretarias municipais exclusivas para a temática, em apenas 6,5% dos municípios.
Quanto maior o município, maior a chance de existência de um organismo de políticas para mulheres na organização do governo. Entre os municípios com até 5 mil habitantes, apenas 10,3% possuíam alguma estrutura para tratar da temática, sendo que 77% eram setores subordinados à outra secretaria. Entre os municípios mais populosos, a existência de organismos de políticas para mulheres é significativamente mais elevada, alcançando 90% entre aqueles com mais de 500 mil habitantes. São também instâncias mais fortalecidas e com maiores recursos e possibilidades de ação. Dos municípios com mais de 100 mil habitantes, 15% instituíram secretarias exclusivas.
Em uma relação inversa com os indicadores de desenvolvimento humano e de pobreza, proporcionalmente a maior concentração de municípios dotados de institucionalidades para tratar da temática de gênero está na Região Nordeste e a menor no Sudeste.
Entre os municípios nordestinos, quase 20% possuem estruturas de políticas para as mulheres, contra 15,7% do Sudeste. O Piauí é o estado com maior número absoluto de municípios com algum tipo de estrutura na área (107), seguido de Minas Gerais (102) e São Paulo (93).
No outro extremo, encontram-se Roraima (nenhum organismo), Acre (3) e Amazonas e o Rio Grande do Norte (9). Apesar do reduzido número de organismos nos estados nortistas, o Amapá é o estado que apresenta a melhor cobertura, 15 dos seus 16 municípios possuem tais organismos, 94%.
A MUNIC 2009 ressalta que a existência de organismos de políticas para mulheres não assegura a existência de condições adequadas de desenvolvimento dos trabalhos, impactando na reduzida possibilidade de articulação com órgãos locais e de implementação direta de políticas e ações na área. Em geral, têm escassez de recursos financeiros, humanos e/ou materiais. Exemplo dessa situação é a baixa proporção de municípios que destinam aos seus órgãos gestores da política de gênero um orçamento próprio: 36% do total de municípios brasileiros. No entanto, entre aqueles municípios com mais de 100 mil habitantes, esta proporção alcança os 52,8%, o que certamente está relacionado à maior organização e disponibilidade de estrutura dos mais populosos, afirma o estudo.
Além de mulheres, os organismos governamentais ligados a gênero também atendem outros segmentos da população: em 77% dos municípios eles atendem idosos (86,1%), crianças e adolescentes (87,2%) e pessoas com deficiência (67,6%).
Já em relação às áreas cobertas, os dados da MUNIC permitem ver que 36% dos municípios com mecanismos que atendem às mulheres desenvolvem ações de capacitação em gênero para outros órgãos do governo municipal e 76,5% se articulam com outras estruturas governamentais para que estas incorporem, em suas políticas, ações para a promoção da igualdade de gênero, o que contribui decisivamente para aprofundar a transversalização do tema. Quando atuam por meio da articulação intragovernamental, os mecanismos que atendem às mulheres tendem a privilegiar os setores da educação (62,6%) e saúde (64,4%), seguidos por violência, trabalho e cultura, todos em torno de 50%, e política (24%). De modo geral, quanto maior a população do município, maior é a proporção de mecanismos que se articulam no âmbito dos governos para assegurar o desenvolvimento de ações em cada área temática.
O estudo aponta que a questão da violência, tradicionalmente uma forte bandeira do movimento feminista e uma área privilegiada de atuação do governo federal, configura-se, especialmente nas ações de articulação, em um dos últimos setores de interesse para os organismos de municípios com até 50 mil habitantes, talvez pela menor magnitude do fenômeno ou de sua menor publicização, ou porque seja uma política que demande investimentos superiores à capacidade instalada. Entretanto, há um crescimento progressivo no desenvolvimento de tais ações conforme se caminha em direção aos municípios mais populosos. Naqueles com mais de 500 mil habitantes, o tema da violência foi o que mais mereceu investimentos. O movimento é parecido nas ações desenvolvidas para a área de poder, cada vez mais significativas, conforme aumenta o tamanho da população dos municípios, o que, novamente, reforça a maior articulação destes com o governo federal e, consequentemente, sua maior aproximação com novas temáticas.
A articulação das ações desenvolvidas, no âmbito municipal com as diretrizes emanadas do governo federal, pode ser preliminarmente percebida por meio da existência de Planos Municipais de Políticas para as Mulheres. Isso porque desde 2004 os órgãos da administração pública federal trabalham segundo as orientações do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, cuja municipalização e estadualização têm sido estimuladas, apesar de ainda muito incipiente. Apenas 3,5% dos municípios e 18,5% daqueles que contam com mecanismos que atendem às mulheres possuíam Planos Municipais de Políticas para as Mulheres.
Os estados com maior número de municípios com planos são os do Rio Grande do Sul (26), Pernambuco (20), Minas Gerais e Maranhão (19). Na outra ponta, estão os Estados de Roraima, Amapá e Rio Grande do Norte (nenhum plano) e Acre e Amazonas (1).
A MUNIC também constatou que não existe uma relação necessária entre a existência de institucionalidade e o desenvolvimento de ações para mulheres. Uma constatação importante é a de que existem mais municípios desenvolvendo ações de gênero em parceria do que municípios com mecanismos próprios: são 1.799 contra 1.043 municípios com organismos.
Grande parte das ações executadas em parceria se dá por meio do apoio da própria administração pública municipal (64%), seguida dos governos federal (33%) e estadual (32%) e organizações não governamentais (29%). Pouquíssimos municípios (2%) desenvolvem atividades em conjunto com organizações religiosas, fato interessante do ponto de vista da proteção da laicidade do Estado. A execução de parcerias é uma prática mais frequente entre os municípios de maior porte populacional, o que pode estar relacionado à maior capacidade de elaboração de projetos para atender às necessidades e exigências das organizações parceiras.
Assim, enquanto menos de 30% dos municípios com até 50 mil habitantes realizava alguma ação em parceria, nos mais populosos essa proporção alcançava 95%, indicando que o trabalho por meio de convênios, cooperação e/ou articulações é a regra.
A participação social nos governos municipais
Segundo os dados da MUNIC, o País conta, hoje, com conselhos em 594 municípios, o que representa 10,7% do total. Os municípios da região Norte são os que, proporcionalmente, mais contam com Conselhos Municipais dos Direitos da Mulher: 13,8% do total. Em seguida, estão os municípios do Sudeste (12,4%), do Centro-Oeste (11,6%), do Sul (11%) e do Nordeste (7,8%). Há uma tendência em encontrar mais organismos que conselhos nos municípios. Sobre o efetivo funcionamento dos conselhos, pouco mais de 2/3 dos municípios (69,2%) informaram que os conselhos realizaram reuniões nos últimos 12 meses.
Com relação à Rede de Atendimento a Mulheres Vítimas de Violência, os dados levantados pela MUNIC mostram que existem, hoje, no país, 262 municípios com Casas Abrigos (4,7%), 559 com Centros de Referência de Atendimento à Mulher (10%), 397 com Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (7,1%), 469 com Núcleos Especializados de Atendimento à Mulher das Defensorias Públicas (8,4%), e 274 com Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (4,9%).
De maneira geral, os municípios com serviços especializados estão concentrados na Região Sudeste (35,1% dos que possuem Casas Abrigos e 32,2% dos que contam com Centros de Referência). As regiões com menores disponibilidades de serviços são a Norte e a Centro-Oeste. Proporcionalmente, são sempre os municípios de maior porte populacional os que mais contam com serviços disponíveis. No caso das Casas Abrigos, por exemplo, enquanto 6,2% dos municípios com até 10 mil habitantes contavam com este serviço, este percentual alcança 28,8% nos municípios com população entre 100 mil a 500 mil habitantes, e 67,5% naqueles com mais de 500 mil habitantes.
Apesar de serem ainda poucos os serviços disponíveis, especialmente ao se considerar a magnitude do fenômeno, importante considerar que esta rede foi construída em um período muito curto de tempo, respondendo a uma política recentemente instalada e estando ainda em fase de expansão e consolidação. Até 2003, as Casas Abrigos e as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher constituíram as principais respostas dos governos (federal, estadual e municipal) à questão da violência contra as mulheres.
A partir de então, as políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres foram ampliadas e passaram a incluir ações de prevenção, de garantia de direitos e de responsabilização dos agressores (combate). No eixo da assistência, a rede de atendimento à mulher foi redimensionada, passando a compreender outros serviços além dos abrigos e das delegacias, tais como: Centros de Referência de Atendimento, Defensorias da Mulher, Promotorias da Mulher ou Núcleos de Gênero nos Ministérios Públicos, Juizados Especializados, Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), entre outros.
Confira a íntegra da Pesquisa de Informações Básicas Municipais: Perfil dos Municípios Brasileiros 2009 (MUNIC 2009) na seção de “Estudos e Pesquisas” do site www.maismulheresnopoderbrasil.com.br
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